sábado, 7 de abril de 2012

A sabatina dos candidatos

JC Teixeira Gomes*
A minha proposta de instituir um curso de história da Bahia, para todos os canditados à Prefeitura de Salvador, obteve dos leitores a maior aprovação. Restringi-me, inicialmente, à capital baiana, pelo estado de devastação a que chegou Salvador nos últimos anos.
Se é certo que ninguém fracassa por vontade deliberada, passei a considerar que o desgoverno da nossa capital decorre, por parte dos dirigentes municipais, do desconhecimento das nossas tradições e do legado do nosso acervo urbanístico e arquitetônico.
Tudo, enfim, que pode ser corrigido com uma dose de leitura colhida nos, livros ignorados pelos políticos, mas necessários para a melhor compreensão de Salvador e  da sua real dimensão no contexto nacional.
Sim, porque não é possível deixar de admitir que só a ignorância explica a agressão urbanística, arquitetônica e ambiental que Salvador sofreu nos últimos oito anos.
Poderão argumentar que fatos escandalosos como a inércia ante o metrô que não funciona, a degradação prematura da Avenida Paralela, o abandono da orla marítima, a ausência de novos escoamentos para o tráfego insuportável, a aberração urbana representada pelo insolúvel problema do Aeroclube, numa área plantada à beira-mar, que qualquer cidade do mundo se orgulharia de valorizar, a ruína do Centro Histórico são itens que não dependem de leitura ou formação cultural. Ledo engano.
Todo o acúmulo desses angustiantes problemas decorre do alheamento municipal diante das particularidades de Salvador e da feição única da sua realidade topográfica e urbanística, acrescentemos a desinformação cultural, que se corrige com leituras adequadas, que até poderão servir para dar um verniz à mera ambição do poder.
Estou esperando que se defina a sucessão para cobrar dos canditados à prefeitura uma posição quanto à minha proposta. No momento, lembro que todos eles lucrarão lendo (nem precisa ser de modo exaustivo) obras de Edson Carneiro, Afrânio Peixoto,  Alberto Silva, Afonso Ruy, Luís Monteiro da Costa, Milton Santos, Pinto de Aguiar, Pedro Calmon, Kátia Mattoso. A poesia imensa de Castro Alves, a satírica de Gregório de Mattos (para que aprendam como o poder é ilusório), os romances do ciclo baiano de Jorge Amado.
E, entre os autores contemporâneos, a mestra Consuelo Novais Sampaio, com seu prodigioso tratado sobre as tradições urbanísticas da Bahia; o poeta Rocha Peres, demolidor dos demolidores da velha Sé; os eruditos Cid Teixeira, Dias Tavares e Waldir Oliveira, que vasculharam a história e a economia da nossa terra.
De quebra, poderiam olhar fotos de Pierre Verger e Voltaire Fraga para avaliar a perda da dignidade urbanística da Bahia. A esses nomes acrescento o de Consuelo Pondé, para que, à frente do Instituto Geográfico e Histórico, organize em sessão pública, com transmissão pela TV, a sabatina de todos os canditados. Veremos então se aprenderam algo, a fim de bem administrar Salvador.
Na parte da imprensa, recomendo aos candidatos a leitura quinzenal da trinca de valor aí do lado direito, meus queridos colegas Waltinho Queiroz, incansável em denunciar a desfiguração do Carnaval e das festas populares da cidade; Luiz Mott, paladino  e advogado da nossa continuidade cultural; e Dimitri Ganzelevitch, imperador de Santo Antônio Além do Carmo, que, em artigo recente, fez denúncia estarrecedora em A TARDE: os ratos invadiram o bairro pelo  lixo que a prefeitura ali permite acumular-se. Desses três bravos mosqueteiros serei apenas o D'Artagnan no exílio, levado pelo meu sôfrego coração e pela pena de aço.
Como minha proposta é para valer, terminarei citando Casimiro de Abreu: "Todos cantam sua terra, também vou cantar a minha, nas débeis cordas da lira, hei de fazê-la rainha".
Pois, enfim, esta é a vocação de Salvador da Bahia: ser a rainha das terras brasileiras, e não a mendiga desfigurada e coberta de andrajos em que a transformaram nos últimos anos.
JC Teixeira Gomes é jornalista, membro da Academia Baiana de Letras. Articulo publicado em A TARDE - 10/03/2-12